Se tu viesses ver-me de Florbela Espanca
«Se tu viesses ver-me hoje à tardinha,
A essa hora dos mágicos cansaços,
Quando a noite de manso se avizinha,
E me prendesses toda nos teus braços...
Quando me lembra: esse sabor que tinha
A tua boca... O eco dos teus passos...
O teu riso de fonte... Os teus abraços...
Os teus beijos... A tua mão na minha...
Se tu viesses quando, linda e louca,
Traça as linhas dulcíssimas dum beijo
E é de sede vermelha e canta e ri
E é como um cravo ao sol a minha boca...
Quando os meus olhos se me cerram de desejo...
E os meus braços se estendem para ti...»
IV de Florbela Espanca
« És tu! És tu! Sempre vieste, enfim!
Oiço de novo o riso dos teus passos!
És tu que eu vejo a estender-me os braços
Que Deus criou para me abraçar a mim!
Tudo é divino e santo visto assim...
Foram-se os desalentos, os cansaços...
O mundo não é mundo: é um jardim!
Um céu aberto: longe, os espaços!
Tudo o que é chama a arder, tudo o que se
sente,
Tudo o que é vida e vibra eternamente,
É tu seres meu, Amor, e eu ser tua!»
O maior bem de Florbela
Espanca
«Este querer-te bem sem me quereres,
Este sofrer por ti
constantemente,
Andar atrás de ti sem tu me veres
Faria piedade a toda a
gente.
Mesmo a beijar-me, a tua boca mente...
Quantos sangrentos
beijos de mulheres
Pousa na minha a tua boca ardente,
E quanto engano nos
seus vãos dizeres!...
Mas que me importa a mim que me não queiras,
Se
esta pena, esta dor, estas caseiras,
Este mísero pungir, árduo e
profundo,
Do teu frio desamor, dos teus desdéns,
É, na vida, o mais
alto dos meus bens?
É tudo quanto eu tenho neste mundo?»
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