segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

hereditariedades...



Já aqui falei muitas vezes sobre a minha avó, é verdade, mas é também verdade que todas as linhas que possa escrever serão insuficientes para descrever o tanto que ela me deu. A minha avó foi a minha primeira mãe. Foi quem me criou, com quem vivi e partilhei cama os primeiros dez anos da minha existência. Sim, eu dormia com a minha avó, porque a casa era demasiado grande, o soalho rangia demais, e a minha imaginação corria (ainda corre) demasiado selvagem, porque era (ainda sou) demasiado friorenta mas, sobretudo, porque gostávamos demais uma da outra para nos abandonarmos cada uma em seu quarto a gozar uma solidão demasiado pesada. Todos os dias a minha avó via-se e desejava-se para me aturar, berrava, ameaçava bater-me. Eu era arisca, respondona, desobediente mas, todos os dias, invariavelmente, dormíamos agarradas, de pés entrelaçados.
Não saio muito à minha avó, nem no parecer nem no jeito de ser. Mas, a convivência molda-nos, nós somos o reflexo daqueles que connosco se cruzaram e, por isso a minha avó está em mim. Está na emotividade, na lágrima fácil, na sensibilidade que nos faz ficar ofendidas com facilidade.  Está no coração mesmo junto à boca (o que, provavelmente, me vai fazer perder uma aposta nos próximos dias), na incapacidade de ignorar quando nos fazem mal, está no incomodo que sinto quando não estou em paz, e na forma como isso se reflecte imediatamente no bem estar físico. Está nas cismas, nos silêncios, na enorme capacidade de perdoar mas, sobretudo, naquilo que muitos apelidam de orgulho, e que é na verdade amor próprio. 
Uma das memórias mais nítidas que tenho da minha avó, era a forma determinada com que afirmava não querer ser um peso, um estorvo para ninguém. A minha avó não pedia ajuda, por muito que precisasse, não incomodava, não cobrava. A minha avó não impunha a sua presença, nem reclamava dos outros o que era obrigação deles dar. Afinal, dizia ela "quem gosta de nós mantém-nos perto, dá-nos sem pedir, se não nos quer perto, então é porque não gosta de nós, e a esses, nada poderemos exigir"...

5 comentários:

Netas da Casa Azul disse...

Ler textos sobre avós, assim bonitos, é coisa para me deixar o coração apertadinho...

Gija disse...

Identifico-me muito em muitas dessas coisas, o que é normal uma vez que alguém que nos conhece bem ás duas diz que somos "iguaisinhas"

Mona disse...

:-)
jantar de 30 alguém vai págár...

Mariana disse...

A tua avó era uma mulher sábia.

Inês disse...

Sabes que estou aqui com uma lágrima no canto do olho e estou a sorrir? Porque entendo-te a ti a ao sentimento. Muito do que eu hoje sou devo às minhas avós. Foram avós e mães. As duas muito diferentes (uma queria-me bater para eu comer, a outra dava-me a volta), mas muito iguais.
E agora, estou a reflectir, e sei que se elas me estiverem a ver estão orgulhosas da neta.
E a lágrima caiu....